Quanto de plástico a sua lavadora de roupas envia para o mar?

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Não é segredo que muitos dos produtos feitos de plástico que usamos acabam no oceano. Mas você pode não estar ciente de uma das principais fontes dessa poluição: nossas roupas.

Poliéster, nylon, acrílico e outras fibras sintéticas — todas formadas com plástico — são hoje cerca de 60% do material que compõe nossas roupas em todo o mundo. As fibras sintéticas de plástico são baratas e extremamente versáteis, proporcionando elasticidade, respirabilidade, conforto no calor e robustez nas roupas de inverno.

Essas fibras contribuem para a poluição dos oceanos de uma maneira sutil, mas impactante: os fragmentos do tecido penetram no meio ambiente, levados pela água. As estimativas variam, mas é possível que  uma lavagem de roupa possa liberar centenas de milhares de fibras para o esgoto.

E essas pequenas fibras — com menos de 5 milímetros de comprimento, com diâmetros medidos em micrômetros (um milésimo de milímetro), podem, eventualmente, alcançar o oceano. Lá, elas vão contribuir com a poluição microplástica que está se acumulando na cadeia alimentar e sendo ingerida por todos os tipos de vida marinha, e até mesmo por nós. A maior parte do plástico que está no oceano não está na forma de produtos inteiros, como copos ou canudos, mas sim em pequenos pedaços.

“Pense em quantas pessoas estão lavando suas roupas diariamente, e quantas peças todos temos”, diz Imogen Napper, um cientista marinho da Universidade de Plymouth, co-autor de um estudo de 2016 sobre as fibras de plástico que saem das nossas roupas. “Mesmo quando estamos andando por aí, pequenas fibras estão caindo. Está em toda parte.”

Em todo o mundo, agora há esforços vigorosos para reduzir o uso de alguns dos produtos que acabam nos oceanos, como copos plásticos, canudos e sacolas de compras. À medida que buscamos soluções para a questão geral da poluição plástica, precisamos reconhecer que nossa roupa é uma parte importante do problema e também precisaremos fazer parte da solução.

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Grande parte do problema dos microplásticos é provindo das roupas sintéticas

Considere o fiapo que você encontra na secadora. Esse fiapo é um pequeno pedaço de linha de sua roupa que foi desalojado e é pego por uma tela de malha.

Da mesma forma, fibras sintéticas saem na lavagem — mas são muito pequenas e não há filtro dentro das máquinas para capturá-las. Em vez disso, essas minúsculas fibras de plástico passam para as estações de tratamento de esgoto, que geralmente não têm filtros finos o suficiente para detê-las (e, se o fizerem, as fibras podem acabar em outro subproduto do esgoto: o fertilizante). As águas residuais tratadas são, então, despejadas nos rios ou no mar, transportando fibras de roupas plásticas, como um estudo de 2011 descobriu.

Em 2016, Napper e um colega projetaram um teste para ver quantas dessas fibras poderiam ser eliminadas na lavagem. Eles montaram uma lavadora de roupas Whirlpool frontal com um filtro especial para coletar pequenas fibras. Eles testaram amostras de três tipos de tecidos: uma camiseta de poliéster-algodão, um capuz de poliéster e um suéter acrílico. Depois de algumas lavagens (todas as roupas perdem mais fibras quando são novas), o tecido acrílico é o que mais libera, seguido pelo poliéster e depois pela mistura de poliéster e algodão.

“Descobrimos que em uma lavagem típica, 700 000 fibras poderiam sair”, disse Napper. Outros estudos surgiram com estimativas diferentes. Uma pesquisa de 2011 descobriu que 1900 fibras poderiam ser liberadas de uma única peça sintética em uma lavagem; outro estudo estimou que 1 milhão de fibras poderiam ser liberadas da lavagem de lã de poliéster.

É difícil definir a quantidade exata de poluição plástica por lavagem, pois existem muitas variáveis ​​que podem contribuir para a perda de fibras ou não: composição das roupas, materiais usados, temperatura da água, tipo de detergente, amaciante de roupas, quão cheia a máquina está, etc. Um estudo descobriu que as máquinas de lavar top-load (com a tampa na parte superior) liberam sete vezes mais microfibras do que as que tem a tampa na parte frontal.

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Os riscos que os microplásticos podem causar

E, mesmo que a quantidade de plástico que sai por lavagem seja pequena, medida em miligramas, ela se soma, o que gera uma proporção muito grande do material. Um artigo na Environmental Science and Technology estimou que “uma população de 100 000 pessoas produziria, aproximadamente, 1,02 kg de fibras por dia”. São 360 kg de microplásticos por ano.

E parte disso alcançará o oceano. “Uma grande proporção será detida no tratamento de esgoto, mas a outra parte, que não é coletada, vai se acumular”, diz Napper. E uma vez que os plásticos estão no ambiente oceânico, “não há uma maneira eficaz de removê-los”.

Essas minúsculas partículas de plástico podem ir parar nas dietas da vida marinha e se acumulam em toda a cadeia alimentar.

Microplásticos podem ser tóxicos para a vida selvagem por si próprios, mas eles também podem agir como esponjas, absorvendo outras toxinas na água. Pior, eles podem ser ingeridos por todos os tipos de vida marinha e se acumular na cadeia alimentar. Um estudo recente descobriu que cerca de 73% dos peixes capturados nas profundezas do oceano, no noroeste do Atlântico, tinham microplásticos em seus estômagos.

“Sabemos muito pouco sobre os impactos das microfibras na saúde de animais e pessoas”, Mary Catherine O’Connor, repórter da Ensia. “Mas o que sabemos é que é preciso de mais pesquisas adicionais”.

Aparentemente, onde quer que os cientistas olhem, eles estão encontrando fibras plásticas contaminando o meio ambiente. Frequentemente, as fibras plásticas têxteis são a fonte dominante de poluição por plástico encontradas nas pesquisas. Essas fibras foram encontradas nas praias que cercam os sedimentos, nos mangues e no gelo do Ártico — até mesmo nos produtos que comemos e bebemos. “A pessoa ingere, em média, mais de 5800 partículas de detritos sintéticos” em um ano, segundo um artigo recente no PLOS. E a maioria dessas partículas são fibras plásticas.

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As microfibras de plástico estão por toda parte

Um estudo de 2017 sobre a poluição por microplásticos ao longo das margens do rio Hudson, no estado de Nova York, descobriu que ele transporta cerca de 150 milhões de microfibras de plástico para o oceano Atlântico todos os dias. É difícil dizer se essas fibras entraram no rio a partir de estações de tratamento de águas residuais ou escoamento de águas pluviais, ou apenas flutuaram no ar, mas, como diz Napper, “está em toda parte”.

É difícil dizer quanto os microplásticos de têxteis contribuem para o problema geral da poluição plástica no oceano.

Como os microplásticos são tão pequenos — e muitos deles acabam no fundo do oceano — é difícil obter um censo preciso deles. Dito isso, um relatório da União Internacional para a Conservação da Natureza de 2017 estimou que cerca de 35% dos microplásticos que entram no oceano vêm através dos tecidos sintéticos. Também destacou como este é um problema global: os têxteis sintéticos são mais comuns em países em desenvolvimento, que muitas vezes não têm instalações de tratamento de águas residuais robustas para filtrá-los.

Independentemente da proporção exata, “sem dúvida”, escreve Flavia Salvador Cesa, pesquisadora de microplásticos da Universidade de São Paulo, em um e-mail, “as fibras são um importante contribuinte para a poluição plástica”.

E lembre-se: o plástico pode levar centenas de anos, possivelmente milênios, para se degradar. O plástico que jogamos no oceano agora permanecerá por gerações.

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Então, o que podemos fazer sobre isso?

Pode parecer que há uma solução fácil para o problema de nossas roupas liberarem plástico: basta comprar menos peças ou apenas as feitas com fibras naturais.

Mas não deveria ser um luxo ter consciência ambiental. Muitas vezes, as roupas sintéticas são mais acessíveis.

Para que uma solução seja viável, ela “precisa ser acessível a todos”, diz Napper. Muitas vezes, um consumidor consciente do meio ambiente tem mais poder financeiro. Não podemos esperar que todos saiam e comprem canudos de aço inoxidável ou garrafas de água de vidro. É uma mensagem de surdez, semelhante à da classe que insiste que todos precisam estar usando apenas algodão orgânico, lã ou roupas de cânhamo (e os tecidos naturais podem forçar o meio ambiente de outras maneiras, como exigir grandes quantidades de água para serem produzidos).

As soluções precisam ser mais sistêmicas. E elas podem começar em nossas lavadoras de roupas.

“As máquinas de lavar precisam ser projetadas para reduzir as emissões de fibras ao meio ambiente; no momento elas não são”, diz Mark Browne, um cientista ambiental da University College Dublin, que encontrou evidências de poluição por microfibras provenientes de estações de tratamento de águas residuais. Atualmente, a Napper está trabalhando em um projeto para verificar se os filtros de fibra para as lavadoras de roupas são uma solução viável.

Os fabricantes de têxteis também poderiam projetar tecidos que perdem menos fibras, as empresas de vestuário os utilizariam e os consumidores poderiam ser mais conscientes.

“Ainda sabemos pouco sobre como minimizar os impactos ambientais da lavagem de nossas roupas”, diz Cesa. Mas há duas recomendações gerais para os consumidores: compre menos roupas e “lave apenas quando necessário”.

Traduzido e adaptado de Vox.

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